A Associação de Moradores da Comunidade Melancias do Município de Gilbués-PI e a Comissão Pastoral da Terra vem a público denunciar a reincidência do conflito no Território Melancias.
As populações tradicionais continuam sendo alvos da expropriação dos territórios no Cerrado do Piauí, além das várias outras ameaças, o isolamento social por conta da COVID-19 não intimida os conflitos no campo e as famílias sofrem com o risco da doença e o avanço da violência em seus territórios.
O território Melancias é impactado pela Fazenda Alvorada, a Fazenda Paraíba, Fazenda Roda de Ferro e por grileiros locais. Nesta quinta-feira, 07 de maio as famílias foram surpreendidas com duas Retroescavadeiras desmatando próximo a Passaginha, uma das comunidades que compõe o território. Segundo os moradores, o proprietário da suposta Fazenda Paraíba conhecido por Celso Constantino, comentou que iria desmatar uma área na comunidade e nesta quinta-feira o maquinário já estava trabalhando nesta região.
Importante destacar que este não é o primeiro episódio de violação de direitos ocasionado pelo Senhor Celso pois, o mesmo já vem derrubando cercas, fazendo aceiros, expulsando famílias de suas áreas coletivas e afirmando que cercará toda a região em que vivem e trabalham estas famílias. Não o bastante, no dia 04 de Agosto de 2019, o mesmo ameaçou o morador do território, Valdim Alves, ordenando que retirasse uma das cercas construídas pela comunidade e caso não fizesse, Celso afirmou que iria “Pinicá-lo com um facão”. As famílias registraram boletim de ocorrência no 10º DRPC de Corrente no Piauí, mas até o incidente do dia 07 de Maio de 2020, não se sabe que encaminhamentos foram tomados em relação ao registro.
Destaca-se que a comunidade está incluída do projeto de Regularização Fundiária do Governo do Estado do Piauí financiado pelo Banco Mundial, através do Projeto: “Piauí Pilares do Crescimento e Inclusão Social“. Nesse processo o Instituto de Terras do Piauí – INTERPI em agosto de 2018 realizou o estudo antropológico e o levantamento do território. No levantamento dominical feito pelo INTERPI constatou-se que se trata de terras públicas devolutas , sendo que o mesmo já fez a abertura do processo discriminatório para repassar as famílias do território a posse definitiva da área. Entretanto, o processo discriminatório que se encontra na justiça atrasou e isso facilita a ação dos grileiros que afirmam serem donos da área. Sendo o INTERPI parte interessada no processo solicitamos ainda que haja um acompanhamento sistemático do mesmo.
Diante deste cenário, manifestamos nossa solidariedade e apoio a comunidade ameaçada e em luta na defesa de seus territórios. Exigimos em caráter de urgência a intervenção dos órgãos competentes para a garantia da integridade e a proteção das famílias, como também a resolução da problemática em questão. Além disso, repudiamos o descaso e exigimos o tratamento devido dos órgãos de segurança pública, garantindo os direitos das famílias envolvidas.
Histórico do Conflito
As Famílias do território são impactadas pela Fazenda Alvorada que está dentro da área da comunidade e tem privado as famílias do uso das verendas para criação do gado, inclusive cercaram uma das veredas existentes no território. Além da Alvorada, a Fazenda Passaginha tem desmatado e destruído parte da mata ciliar do Uruçuí Preto e de sua nascente. E ainda a Fazenda Paraíba que tem apresentado recorrentes episódios de violência contra as famílias residentes no território. Além disso, O uso do veneno nas lavouras do Cerrados tem alterado a coloração e a qualidade da água do Rio Uruçuí Preto, tanto que no início da temporada de chuvas o rio fica com uma coloração alaranjada, pois o veneno aplicado na lavoura é carreado para dentro dele.
No dia 04 de Agosto de 2019, um dos Grileiros de Terra que afirma ser dono da Fazenda Paraíba ordenou que a cerca da comunidade fosse retirada, abriu um aceiro próximo à comunidade e ameaçou “pinicar com um facão” o trabalhador rural Valdim Alves, morador do território, caso não retirasse a cerca. No mesmo mês a Fazenda Alvorada enviou dois agrimensores no território para medir pontos geográficos dentro da área da comunidade, a equipe identificou-se como sendo da Secretaria de Meio Ambiente do Estado, mas não houve mais explicações à comunidade.
Em novembro de 2019 a Fazenda Alvorada expulsou as famílias da sua área coletiva de solta do gado e das roças. Com auxílio da polícia e jagunços da fazenda, chegaram à comunidade ribeirinha do território Melancias e colocaram uma parte do gado das famílias para o outro lado do rio. A ação foi realizada durante toda parte da tarde com a presença da polícia militar de Gilbués-PI. Vale ressaltar que não foi apresentado nenhum documento oficial que justificasse a ação, sendo ela assim, arbitrária, autoritária e violenta.
LEIA TAMBÉM
NOTA PÚBLICA: NO CERRADO, POLÍCIA EXPULSA MORADORES DA TERRA ONDE PRODUZEM.
NOTA PÚBLICA: Violência no Cerrado Piauiense
Nota Pública: No Cerrado piauiense, comunidades sofrem violências e perdem seus territórios
Conhecendo o Território Melancias
O Território Melancias é composto por seis comunidades, Passagem da Nega (Passaginha), Sumidouro, Brejo das Éguas, Riacho dos Cavalos e Melancias I e II. Situado a 94km da sede do Município de Gilbués no Sul do Piauí, Brasil, é constituído por 38 famílias que vivem as margens do Rio Uruçuí-preto. As famílias vivem da extração do buriti, mangaba, pequi e do cultivo da mandioca, do feijão, do arroz e milho. Além de frutas como manga, acerola, limão, laranja, goiaba e melancia. Também criam gados no sistema de solta em áreas coletivas, porcos, ovelhas e galinhas caipiras.
As famílias do Território Melancias resistem protegendo a floresta e as águas na defesa do rio Uruçuí Preto e do seu território para a manutenção do seu modo de vida, assegurando vida digna e em abundância para as presentes e futuras gerações.
Texto: CPT Piauí Imagens: Associação do Território Melancias
Mais informações sobre o território assista o Documentário “Melancias” um resgate a cultura, memória, luta , protagonismo e resistência das famílias.